Novas negociações indiretas entre Israel e o Hamas parecem mostrar progressos. Depois de mais uma rodada de debates em Paris no último final de semana, um acordo parece estar mais próximo do que nunca. Ainda há diferenças entre as partes, mas já existe pelo menos um esboço do que pode ser um plano de cessar-fogo para interromper este ciclo de violência entre israelenses e palestinos. Internamente, população israelense pressiona governo.

Henry Galsky, correspondente da RFI em Israel

O Gabinete de Guerra de Israel recebeu de David Barnea, diretor do Mossad, o serviço secreto, a atualização sobre as negociações em Paris. Na sequência, este fórum reduzido que tem o poder de tomar as decisões sobre as operações militares israelenses aprovou a viagem de uma delegação para o Catar de forma a prosseguir com as negociações. Segundo fontes do Egito, as conversas já estão em curso. 

Se em Paris o debate foi sobre as linhas gerais do acordo, no Catar a expectativa é de conversas mais específicas. Na prática, isso significa estabelecer números e prazos: quantos reféns serão libertados, quando isso vai acontecer, qual a proporção entre reféns israelenses e prisioneiros palestinos, quanto tempo vai durar o cessar-fogo. 

Um dos aspectos mais problemáticos diz respeito à lista de prisioneiros palestinos que devem ser libertados. Principalmente os que têm "sangue nas mãos", como se diz por aqui. Ou seja, prisioneiros julgados e condenados por envolvimento direto em ataques terroristas que resultaram na morte de cidadãos israelenses. 

O Hamas já deixou claro que não recuou na exigência de libertar justamente esses prisioneiros, que são aqueles que cumprem as penas mais longas. 

Esboço

Tzachi Hanegbi, Conselheiro de Segurança Nacional de Israel, disse que "há possibilidades de avanços nas negociações" por um acordo. Hanegbi é um dos nomes próximos ao primeiro-ministro Benjamin Netanyahu. 

A avaliação aqui em Israel é que este é um momento de "otimismo cauteloso", expressão já usada anteriormente e que não produziu os resultados esperados. Mas agora, se de fato o Hamas reduziu as expectativas em relação a números e ao próprio fim da guerra, é possível que um acordo de cessar-fogo seja alcançado antes do início do Ramadã, em 10 de março.

O esboço do acordo já encaminha ao menos linhas gerais de números e prazos debatidos entre as partes. Mas ainda NÃO há um acordo fechado. Esses são os pontos principais:

1 - Libertação de 35 a 40 reféns israelenses. Se inicialmente o Hamas pretendia obter a contrapartida de libertação de milhares de prisioneiros palestinos, agora é possível que este número seja mais modesto, na casa das centenas. Fala-se em 200 a 300 prisioneiros palestinos.

Um dos pontos mais problemáticos das discussões diz respeito à identidade desses prisioneiros. O Hamas não abre mão de libertar os quem cumprem as penas mais longas por terem cometido os crimes mais graves contra cidadãos israelenses. 

2 - Os reféns israelenses a serem libertados neste primeiro momento devem ser mulheres (civis e militares), crianças, idosos e pessoas doentes.

2 - A pausa deve se estender por cerca de seis semanas, tempo que já havia sido proposto anteriormente pelo governo dos Estados Unidos. 

3 - É possível que a primeira libertação de reféns israelenses e prisioneiros palestinos ocorra antes de 10 de março, quando os muçulmanos iniciam as celebrações do mês sagrado do Ramadã. 

4 - O Hamas acredita que nesta primeira fase do acordo as tropas israelenses devem se retirar do centro das cidades da Faixa de Gaza. Além disso, Israel deve permitir o retorno da população do norte do território que foi deslocada para o sul. Uma das exigências do grupo é que Israel retire as barreiras militares que hoje dividem Gaza.

Até o momento, no entanto, não há uma posição oficial por parte do Hamas. Inclusive há relatos contraditórios negando os avanços nas negociações. O Hamas tem afirmado desde as primeiras conversas indiretas que só tem interesse num acordo caso ele esteja vinculado a dois movimentos que Israel se recusa a fazer: retirar as tropas de toda a Faixa de Gaza e dar a guerra por encerrada. 

Pressão doméstica dos israelenses

Internamente em Israel, a população aumenta a pressão sobre o governo. As manifestações que acontecem sempre nas noites de sábado têm mudado de pauta. Ou melhor, tem acrescentado demandas. Se durante este período de guerra os protestos exigiam um acordo imediato por parte da coalizão de Netanyahu, agora a política entrou de vez na agenda. E o alvo é justamente o primeiro-ministro. 

Os manifestantes colocam na conta de Netanyahu as falhas de segurança que levaram aos ataques do Hamas em 7 de outubro e também o acusam de jogar com a vida dos reféns. Isso porque um acordo que liberte os israelenses pode levar ao fim da coalizão, já que alguns dos ministros que compõem o governo ameaçam abandoná-lo a depender dos compromissos assumidos. 

E aí a coalizão poderia perder a maioria das cadeiras do Knesset, o parlamento, o que levaria o país a novas eleições - resultado que Netanyahu não quer, uma vez que as pesquisas mostram que o partido dele, o Likud, pode vir a perder quase metade das cadeiras. 

Todas as pesquisas eleitorais deixam claro que num eventual novo pleito, a oposição ao governo atual passaria a ter amplo controle do parlamento. O levaria Netanyahu a perder o cargo de primeiro-ministro. 

No último final de semana, as manifestações em Tel Aviv sofreram repressão violenta pela primeira vez. A polícia agiu com truculência buscando dispersar a multidão com cavalos e até com canhões d'água. Vinte e uma pessoas foram presas, e cinco, feridas. Essa atuação causou revolta na sociedade, levando a polícia a iniciar uma investigação interna depois da divulgação de imagens e vídeos dos confrontos com os manifestantes.