Conceito de habitat lunar usa força centrípeta para simular ambiente de gravidade da Terra, mas ainda não temos tecnologia para isso


Japão quer habitat de gravidade simulada na Lua até 2050

A ausência de gravidade no espaço é um problema para astronautas a longo prazo. Scott Kelly, que ficou 340 dias na Estação Espacial Internacional (ISS) retornou à Terra com dados valiosos sobre a exposição a ambientes externos por muito tempo, e o quadro geral não é nada bonito.

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Segundo a NASA e a Agência Espacial Canadense (CSA), astronautas em missões prolongadas tendem a perder de 20% a 40% da massa muscular, de 1% a 2% da densidade óssea por mês, especialmente nas pernas, e apresentar um quadro irreversível de rigidez arterial normalmente presente em idosos, com artérias e veias se comportando como se tivessem de 20 a 30 anos a mais.


A cena do jogging em Zero-G de 2001: Uma Odisseia no Espaço usou uma "roda de hamster" gigante; a proposta dos japoneses é parecida (Crédito: Reprodução/Stanley Kubrick Productions/MGM/Amazon)


Com excessão da rigidez arterial, que aumenta os riscos de infarto e derrame, os outros sintomas podem ser revertidos na volta à Terra, mas quando olhamos para cenários com a humanidade se espalhando pelo Sistema Solar, e planos para colonizar a Lua e Marte, as coisas se complicam.


A milhões de quilômetros da Terra, as condições de vida de humanos em ambientes sem gravidade seriam dignas de um filme de terror psicológico, onde qualquer machucadinho poderia ser fatal. Por outro lado, não é interessante se manter em um só lugar para todo sempre.


Para Neil DeGrasse Tyson, asteroides são a maneira do Cosmos perguntar "como vai seu programa espacial?", e marcar touca, como os dinossauros, não é legal. Mas se ficar no espaço em ambientes sem gravidades também não é legal a longo prazo, qual a solução?


A resposta mais simples são ambientes de gravidade artificial, ou mais precisamente, simulada. Diversas pesquisas usam o conceito de força centrípeta em propostas de ambientes que giram o tempo todo, criando uma força que mantêm as pessoas, animais e estruturas presas ao "chão" do habitat. Qualquer um que andou em uma montanha-russa sabe disso.


O que nos traz ao projeto um tanto ousado da vez, que para todos os efeitos, não é exatamente um scam, pois partiu de uma parceria entre a Universidade de Quioto e a Kajima Corportation, uma das mais antigas e conceituadas construtoras do Japão.





Em uma coletiva de imprensa transmitida pelo canal da emissora Kansai TV no YouTube, o projeto consiste em uma gigantesca estrutura em forma de cone, alimentada com uma quantidade de energia adequada para mantê-la girando em alta velocidade, de modo que a força centrípeta simule o efeito de gravidade igual à da Terra, mas na Lua.


"Lunagrass", o nome dado à base/estação conceitual, permitiria que os humanos habitantes possam exercer todas as atividades que executam aqui, de trabalho a lazer, e em teoria, até ter filhos fora da Terra, embora não hajam dados extensos sobre o efeito do espaço na expressão genética para fins reprodutivos.


Takuya Ohno, arquiteto-chefe da Kajima Corporation e um dos líderes do projeto, está curiosamente otimista, embora mantenha ao menos um dos pés no chão (da Terra):


Obviamente, (o projeto) não é nem um pouco técnico, mas é importante apresentar novas ideias neste momento.


Se possível, eu quero ir para a Lua. Mais especificamente, eu quero ir para Marte. Eu quero realizar o conceito da Lua, de alguma forma, até 2050.


Para simular gravidade, a estrutura inteira gira. É basicamente Rama (Crédito: Reprodução/Kyoto University/Kajima Corporation/Kansai TV/YouTube)


Qualquer um que leu Encontro com Rama consegue notar as similaridades do texto com a proposta dos japoneses, a estação Lunagrass é basicamente uma aplicação prática dos conceitos de Arthur C. Clarke e Gerard K. O'Neill, estes cientificamente precisos. Nada do que foi apresentado é bobagem de Sci-Fi, o conceito é perfeitamente viável e correto.


O grande, enorme problema, está na escala. Este conceito não é voltado para uma estação de pesquisa, com três ou quatro astronautas fazendo cooper, e sim para uma cidade enorme, com população civil. O vídeo institucional mostra até mesmo um lago/mar, com barcos navegando.


A logística para implementar algo do tipo, na grandiosidade proposta pelos japoneses, não seria apenas infernal, nós simplesmente ainda não temos a tecnologia adequada para implementar algo de tamanha grandiosidade, seja a direta ou a ancilar. E nem vamos falar nos custos astronômicos (no pun intended).


A abordagem ideal seria construir módulos na Terra para transportá-los à Lua, mas atualmente não temos nada capaz de fazer esta viagem. Quer dizer, até temos, mas a politicagem pode manter a Starship no chão por mais tempo.


Uma vez lá, encontrar uma fonte de energia adequada é outro problema. E ainda não temos nada ideal para explorar as reservas de hélio-3 da Lua, então não embarque na onda do "combustível do futuro" dos portais caça-cliques.


Ainda assim, a proposta conjunta da Universidade de Quioto e da Kajima Corporation está sendo vista como um incentivo às novas gerações, para buscarem estudar novas ideias e abordagens para o problema da permanência de humanos fora da Terra a longo prazo, e quem sabe, perseguirem carreiras em STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática).


Quanto à estação Lunagrass, eu diria que um dia iremos desenvolver algo do tipo, mas eu não arriscaria em algo concreto para antes de 2100.


Fonte: Universe Today


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