Em busca de votos para as eleições presidenciais de julho, ONGs e programas estatais têm procurado despertar a atenção de jovens eleitores na Venezuela. De acordo com a associação Voto Jovem, cerca de 3,5 milhões de pessoas que atingiram a maioridade ainda estão fora do sistema eleitoral. Os novos votantes têm até 16 de abril para fazer a inscrição e poder votar.

Elianah Jorge, correspondente da RFI em Caracas

O eleitorado venezuelano observa com cautela a política do país, sobretudo os jovens. A RFI conversou com alguns deles para conhecer as motivações e os receios de participar de uma votação decisiva para o futuro do país, em crise desde 2013. O presidente Nicolás Maduro, há 11 anos no poder, busca a reeleição, enquanto Corina Yoris, suplente da vencedora nas primárias, não conseguiu se inscrever como candidata no Conselho Nacional Eleitoral (CNE).

O voto na Venezuela é opcional, diferentemente do Brasil, onde o comparecimento às urnas é obrigatório. É preciso fazer o registro no sistema eleitoral, em um dos 300 postos de cadastramento disponibilizados pelo CNE em todo o país. Os requisitos para se tornar eleitor são: informar o endereço domiciliar, apresentar a carteira de identidade e ter 18 anos até o dia da votação, em 28 de julho deste ano. Porém, há o impasse da falta de motivação. É o que conta Adriana Ramírez, voluntária que incentiva jovens como ela a votar. 

“Hoje em dia entendemos que na juventude existe muita apatia em relação à política e aos processos eleitorais. E que não existe suficiente participação cidadã, sobretudo por parte dos jovens. Então, os orientamos para que saibam que sua participação é sim importante, que seu voto é importante e que sua responsabilidade não é apenas com o país, mas sim com eles mesmos."     

Gargalo gera demora

O prazo dado pelo CNE para inscrição no sistema eleitoral, de 18 de março a 16 de abril, é considerado curto, tanto pela quantidade de possíveis novos votantes quanto pela reduzida rede de pontos de cadastramento. Segundo a coordenadora nacional da organização Voto Jovem, Mariandreina Montilla, para satisfazer a demanda seriam necessários entre 1.500 e 3.000 postos espalhados em todo o país, uma estimativa muito superior à disponibilizada pelas autoridades.

Esse curto período de registro associado a um número insuficiente de postos de atendimento do CNE tem gerado filas de espera. É o que critica a estudante Samantha, de 20 anos. 

“Demoramos mais de cinco horas no registro porque não querem que nos inscrevamos, isso foi o que eu senti. Não digo que seja a verdade absoluta. No final pude me inscrever, mas não entendi porque demoramos mais de cinco horas em algo que não demorei nem quatro minutos para fazer.”    

Em dezembro passado, o governo venezuelano lançou a Grande Missão Jovem Venezuela para se aproximar desta categoria da população e assim tentar ganhar mais popularidade e votos. O plano oferece “acesso à saúde, proteção e ao lazer saudável”. É possível ver grupos de jovens vestindo bonés e camisas alusivas ao governo, participando de gincanas em áreas públicas nas principais cidades do país. Outro chamariz é o programa “Mude sua imagem”, que oferece aos jovens um novo visual por meio de serviços de cabeleireiro patrocinados pelo partido do governo.

Estrutura não ajuda

Rubén Herrera, de 21 anos, é líder estudantil de uma universidade particular em Caracas. Desde março, ele participa do movimento militante “Estudante, participe e ganhe”, que incentiva a maior quantidade possível de estudantes a se inscrever no CNE. O grupo já visitou 18 universidades em todo o país. “Até o momento inscrevemos cerca de 259 pessoas da Universidade Alejandro Humbold, de Caracas”, conta Herrera. Ele acredita que o número de jovens votantes poderia ser maior, se as dificuldades fossem menos significativas. 

“É sabido que o estudante venezuelano apresenta múltiplas dificuldades para poder estudar. O estudante não estuda porque tem que trabalhar. Se trabalha, não pode estudar. É um dilema no qual muitos estão submersos e isso gera, digamos, uma certa cautela na participação nos processos eleitorais.”    

Entre 50 e 60% dos jovens universitários abandonaram os estudos nos últimos anos para poder trabalhar, segundo o Observatório de Universidades da Venezuela.

Já os possíveis eleitores que estão no interior do país precisam superar as falhas no fornecimento elétrico, a escassez de transporte público e a crise da gasolina para conseguir fazer a inscrição no CNE.

Eleições cruciais

Neste domingo, o Monsenhor Baltazar Porras, figura proeminente da Igreja Católica na Venezuela, aproveitou a homilia na missa transmitida pela TV, para lembrar aos fiéis que faltam poucos dias para terminar o prazo de inscrição no registro eleitoral.

Por sua vez, o comediante Benjamín Rausseo, um dos 13 candidatos à presidência, frisou que “estas eleições são cruciais, não podemos falhar em nada! Peço aos jovens que se juntem, que todos lutemos”.

Leandro García, de apenas 18 anos, aproveitou a última quinta-feira para se inscrever no CNE. Sem saber qual será seu candidato, ele contou à reportagem da RFI que estava ali cumprindo um pedido especial. “(Vim) porque minha mãe me pediu para eu me inscrever.”

Outro fator que leva os eleitores, sobretudo os jovens, a ponderar em quem votar é a escolha de um dos 13 candidatos na disputa, entre eles o ex-preso político Daniel Ceballos, o pastor evangélico Javier Bertucci, o atual presidente Nicolás Maduro e o ex-diplomata Edmundo González. Essa "variedade" tem sido motivo de profunda avaliação por parte do estudante Rubén. 

“Tem sido algo que me mantém em uma profunda meditação, já que muitos dos candidatos presentes nesta eleição presidencial não estiveram presentes nas primárias do ano passado.  Apesar de que há caras já conhecidas, como por exemplo a de Manuel Rosales (governador do estado de Zulia), ainda tenho dúvidas. Acredito fervorosamente que a candidata que deveria estar nesta eleição é Corina Yoris, a suplente de Maria Corina Machado, em vista de que foi inabilitada pelo governo.”  

Fazer a diferença

A empresa Datanálisis divulgou em fevereiro deste ano uma pesquisa feita com 830 pessoas. Segundo a sondagem, seis de cada dez venezuelanos, ou seja 60,9%, estão “muito dispostos” a escolher o futuro presidente. Deste número, 15,2% se identificam com o partido que está no poder (Partido Socialista Unido da Venezuela – PSUV); outros 35,7% afirmaram apoiar a oposição. Já 41,1% disseram que não se identificam nem com o governo nem com a oposição. Um total de 8% optou por não responder.

Mesmo sem ter candidato definido, uma jovem de 20 anos, que preferiu não se identificar, afirma que ir às urnas significa enviar uma mensagem ao país. 

“Considero que é importante (votar) porque de alguma maneira representa uma diferença, um dado que vai entrar nas estatísticas e que poderá ser levado em conta como uma informação. Ainda que não seja um resultado positivo (em caso de vitória do candidato escolhido), mas sim para demonstrar que há pessoas que querem uma mudança”.

A opositora Maria Corina Machado afirmou que caso o presidente Nicolás Maduro volte a ganhar a eleição, 5 milhões de venezuelanos deixarão o país. 

Para Miguel, de 20 anos, sair do país é uma possibilidade mesmo que ele e a família ainda não tenham planos definidos. “Depende muito. Se a situação ficar muito feia, sim (ele sairia do país). Tenho sorte de ao menos ter os meios para poder ir embora do país se algo de ruim acontecer.”