A falência do Silicon Valley Bank (SVB) colocou em alerta o sistema financeiro não apenas dos Estados Unidos. As Bolsas na Europa abriram em leve alta nesta terça-feira (14), após operarem em baixa na véspera. Para conter o temor de um contágio no setor bancário, o governo americano anunciou que garante os depósitos de dois bancos insolventes.

Heloísa Vilella, correspondente da RFI em Nova York

Os maiores bancos americanos, até o momento, não foram afetados como os demais. Os bancos médios e regionais continuam sob pressão. As ações dessas instituições financeiras de pequeno e médio porte despencaram nos pregões da segunda-feira. As ações do First Republic, por exemplo, fecharam o dia com queda de 62% enquanto os papéis do Citibank caíram 7%. Isso é sinal de que ainda existe muita dúvida a respeito da solvência de parcelas do setor financeiro e da eficácia das medidas adotadas pelo governo.

O presidente norte-americano, Joe Biden, anunciou que todos os depósitos no SVB, da Califórnia, e no Signature, de Nova York, estavam garantidos. E realmente, depois de duas ou três horas na fila, muitos correntistas conseguiram sacar o que tinham no banco.

Durante o fim de semana, os assessores econômicos da Casa Branca e do Departamento do Tesouro fizeram reuniões de emergência para adotar medidas que pudessem entrar em vigor antes do dia financeiro começar, na segunda. Anunciaram que todos os depósitos estavam protegidos nos bancos agora encampados pelo governo. Ainda assim, muita gente preferiu sacar logo desses dois bancos e de outros pequenos para depositar em instituições maiores, aparentemente mais sólidas.
Possível efeito colateral
Um efeito colateral dessa crise pode ser o fim da sequência de aumentos das taxas de juros. Tudo indicava que haveria mais uma alta na próxima reunião do Banco Central americano, na semana que vem. De março do ano passado até fevereiro deste ano, a taxa de juros subiu de 0,25% para 4,75%. Mas agora, muitos economistas dizem que seria um erro seguir nessa direção, pois os bancos têm títulos do tesouro americano como garantia dos negócios - títulos emitidos antes que os juros começassem a subir.

Esses investimentos têm uma rentabilidade menor do que os mais recentes. Por isso mesmo, valem menos no mercado. Quando muita gente tentou sacar dinheiro do SVB, o banco precisou vender os títulos para cobrir os saques e não conseguiu levantar o dinheiro necessário, justamente porque esses títulos estão valendo menos hoje. Sem tempo para esperar, o SVB vendeu o que pôde, mas não conseguiu fechar a conta. Por isso vários economistas disseram, na segunda-feira, que é preciso parar com a alta dos juros. Para evitar um problema maior no mercado financeiro. E porque, até o momento, ele não provocou a queda na inflação que o Banco Central esperava alcançar.

Em 2008, o sistema financeiro estava abarrotado de papéis que tinham lastro em prestações imobiliárias supervalorizadas, que despencaram. Agora não. Muitos estão enfrentando problemas de liquidez porque os títulos do tesouro que têm em mãos estão desvalorizados. O governo também anunciou que todos os bancos podem recorrer ao Tesouro se precisarem de empréstimo para fortalecer o caixa. E vai aceitar, como garantia, os títulos do tesouro pelo valor de face e não pelo valor que eles têm hoje no mercado. Assim, o governo espera garantir a liquidez do sistema.

O presidente Joe Biden disse aos americanos que eles podem ficar tranquilos porque o sistema bancário é seguro e avisou que o governo não vai parar nessa primeira medida. Vai continuar fazendo tudo o que for preciso para evitar um contágio. Mas também garantiu que o contribuinte não vai pagar a conta da insolvência do SVB porque o dinheiro que o governo vai usar para pagar os correntistas será recuperado com a venda dos ativos do banco e de outras áreas da empresa, como a divisão de banco de investimentos. Ninguém sabe dizer o que acontece se a venda desses ativos não for suficiente para ressarcir o governo. Biden ressaltou ainda que os acionistas do SVB não serão recompensados.
Responsabilidade de Trump
Muita gente está atribuindo ao ex-presidente Donald Trump parte da responsabilidade pelo que está acontecendo agora. Depois da crise financeira de 2008, o congresso adotou uma lei chamada Dodd-Frank que, entre outras coisas, obrigava bancos com mais de US$ 50 bilhões em ativos a passarem por testes de estresse, uma espécie de check-up completo periódico. Mas muitos banqueiros, entre eles o dono do SVB, fizeram lobby, pressionaram os congressistas, e conseguiram enfraquecer essa lei. No lugar dos US$ 50 bilhões, a marca para se submeter aos testes passou a ser de US$ 250 bilhões em ativos. O SVB escapou por pouco da avaliação.

Em dezembro, o banco já tinha US$ 209 bilhões em ativos. Pela lei original, teria feito os testes de estresse e talvez a situação fosse evitada. Foi o que ressaltou a senadora democrata Elizabeth Warren, conhecida pelas críticas que costuma fazer ao mercado financeiro. Fato é que Donald Trump só assinou essa mudança na lei depois que ela foi aprovada no Congresso com o apoio de 50 senadores republicanos e outros 17 democratas. Ou seja, sobra responsabilidade para todo mundo.