Os espanhóis têm até esta quinta-feira (13) para solicitar o voto por correio para as eleições que, em 10 dias, designarão o próximo primeiro-ministro do país. Alternativa escolhida por aqueles que, em pleno verão europeu, se encontram longe de casa, já foram mais de 2,5 milhões de solicitações de voto por correio, além de mais de 19 mil pessoas contratadas de reforço para fazer chegar às residências as “papeletas”, nas quais os votos são registrados.

Ana Betriz Farias, correspondente da RFI em Madri

Na reta final da corrida pelo posto de primeiro-ministro da Espanha, o assunto do voto à distância foi utilizado como munição eleitoral. Por um lado, o candidato de direita Alberto Nuñez Feijóo (PP) pediu para carteiros trabalharem “de manhã, de tarde e de noite”, independentemente do que digam seus chefes, para conseguir entregar todos os formulários de votação. Feijóo chegou a falar que, se necessário,  pagaria as horas extras trabalhadas, caso seja eleito para o Palácio da Moncloa.

A secretária-geral do PP, Cuca Gamarra, declarou que os Correios “têm a obrigação de disponibilizar todos os meios” para que nenhum desses 2,5 milhões de votos se perca ou não possa se materializar. “E o que ocorre é que nas datas em que estamos, não há meios suficientes para que isso seja garantido”, alfinetou.

O atual primeiro-ministro, Pedro Sánchez, rebateu o discurso dos seus oponentes,  acusando Feijóo de questionar o voto por correspondência para tirar o foco do debate político e criar um clima ruim para que os cidadãos não votem. Sánchez garantiu que o processo eleitoral geral de 23 de julho será “limpo, como sempre”. Na Espanha, o voto não é obrigatório.

Os Correios também se manifestaram dizendo que já têm “orçado e comprometido” o pagamento das horas extras necessárias, e que o processo de voto por correio é seguro no país. “A Junta Central Eleitoral, órgão independente, é responsável por auditar o processo e fazer que ele seja realizado com todas as garantias para os cidadãos”, explica o comunicado emitido pela empresa.Votação antecipada

A campanha das eleições gerais espanholas, que começou oficialmente na última sexta-feira, dia 7 de julho, causa polêmica desde o anúncio de que a votação não aconteceria no fim do ano, como estava previsto. O pleito passou a ter como data o dia 23 de julho depois de o primeiro-ministro dissolver o parlamento.

A decisão de que os espanhóis iriam às urnas mais cedo foi tomada logo após importantes siglas da esquerda espanhola, como o Partido Socialista Obreiro Espanhol e o seu aliado no governo, Unidas Podemos, sofrerem duras derrotas nas eleições locais do dia 28 de maio, feitas para definir representantes dos municípios e das comunidades autônomas espanholas.

Na ocasião, Sánchez declarou que assumia em primeira pessoa os resultados obtidos e que achava importante submeter o atual mandato à vontade democrática. A partir daí, o cenário das eleições gerais começou a se estruturar.

Debate “cara a cara”

Quatro nomes formam, juntos, a lista dos candidatos mais relevantes da corrida eleitoral espanhola. O atual primeiro-ministro tenta a reeleição pelo Partido Socialista Obreiro Espanhol (PSOE), uma das siglas mais tradicionais da esquerda espanhola; Alberto Núñez Feijóo, representa o Partido Popular (PP), de direita; Yolanda Díaz, atual segunda vice-presidente de governo e ministra do trabalho e da economia social, candidata pelo Sumar, coalizão de diversos partidos de esquerda, e Santiago Abascal, presidente do partido de extrema-direita Vox.

Na última segunda-feira (12), a Espanha parou para acompanhar um debate na TV, no qual se reuniram Pedro Sánchez e o candidato do Partido Popular. Feijóo se dedicou a criticar a postura do atual governo, como a lei conhecida como “Só Sim É Sim”, causadora de muitas controvérsias desde sua aprovação.

Já Sánchez tentou ressaltar avanços conquistados pela sua equipe nos últimos anos e insistiu em dizer que o PP e o Vox são iguais. Além de formarem governos locais de coalizão em diferentes regiões do país, os dois partidos repetem alguns dos argumentos utilizados contra o governo socialista.

O tom do debate foi bastante acalorado e com interrupções de ambas as partes.  Como era esperado, o diálogo entre os dois políticos — que representam as siglas majoritárias estão na liderança das pesquisas de intenções de voto — gerou uma intensa repercussão.

Para o jornal espanhol El País, o que se viu foi um mau debate que não respondeu a nenhuma das perguntas essenciais. O periódico ressaltou que Sánchez perdeu a oportunidade de pôr sobre a mesa “excelentes dados relacionados à economia durante sua legislatura”. O editorial destacou, ainda, a falta de assuntos como a política energética e a emergência climática.

Já para o jornal El Mundo, o atual primeiro-ministro espanhol perdeu o confronto demonstrando-se “saturado” diante de um oponente “sereno”. Muitos outros veículos ressaltaram também as mentiras contadas ao vivo pelos dois candidatos.

Este foi o único embate com a presença de Feijóo, que se nega a participar de outros debates, como o que será transmitido pela Radio Televisión Española no próximo dia 19 e do qual participarão Sánchez, Yolanda Díaz e Santiago Abascal.

Particularidades eleitorais

A Espanha é uma monarquia parlamentarista, com o rei Felipe VI chancelando as decisões do Estado. No sistema parlamentar espanhol, cada partido político apresenta uma lista fechada de candidatos a deputados. Os cidadãos não elegem os seus representantes individualmente, mas votando na lista de cada partido – e não necessariamente governa a lista mais votada.

Os partidos podem formar alianças depois das eleições para obter maioria suficiente e eleger um candidato. Assim, após a apuração dos votos, se um partido obtiver a maioria absoluta no Congresso — metade mais uma das cadeiras — poderá governar sozinho. Mas, se não atingir essa maioria, pode formar alianças com outros partidos para poder governar. Assim se configurou o atual governo.

Nas eleições de 2019, o PSOE, sem ter maioria absoluta, pactuou com o Unidas Podemos, obtendo 167 parlamentares a favor da investidura de Pedro Sánchez como primeiro-ministro, ante os 165 que votaram contra. Esta situação política na Espanha é relativamente recente, já que até 2015 reinava o bipartidarismo no país, com o PSOE e o PP como principais partidos políticos.

A partir deste ano, no entanto, novas forças políticas começaram a ganhar relevância nas urnas. Nas últimas eleições, nenhum partido conseguiu a maioria absoluta necessária para governar sozinho. Tudo leva a crer que, nas próximas eleições, as alianças voltarão a ser decisivas para a formação de um governo.